interessado em alguma bobagem

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

a filosofia de um caminho ingrato

- Como assim tenho tudo?  Até parece que sou um ingrato!

- Existe felicidade?

- (rs) Existe!

- Como? Onde?

- Desejo pela felicidade. Acredito que a felicidade é reconhecer-se nesse estado de graça.

- Eu ando sem graça.

- (rs)

- Acho que prefiro o bucólico do… nostalgia.
Quando foi a ultima vez que teve dor de barriga de rir?

- Humm...
Ae é pegar pesado!

- E qual vai ser a próxima vez?

- Quando eu me perder.

- Estar feliz é estranho, nem sempre é quando rolamos no chão de rir. Isso é desprendimento, é liberdade. Estranho, estar livre de amarra, livre, pra mim é um precipício.

- Talvez sua interpretação da liberdade confronte com sua base moral. Por isso, ao encarar a liberdade, busque a libertinagem nela.

- Ufff… isso doeu.

- O quê?

- A palavra, apesar de clichê, libertinagem.

- (rs) Sem amarras, sem julgamentos morais, sem isso ou aquilo. Não há um certo absoluto, nem um errado também. Admiro a sua moral.

- … moral…

- A sua pessoa,
a sua porra louquice
e a sua sensatez…

- Quem sou eu?

- Um não aceite.  Mutilação de tudo o que poderia vir a ser. Antropofagia negativa. Regurgitar-se diante da vida. Enquanto você grita por ela.

domingo, 20 de novembro de 2011

escritos no verso de uma certidão de óbito

Eu escutei a voz doce: “meu filho”

Senti um afago invisível daquela mão enrugada.

Ouvi a risada gostosa

e pude reparar num relampejo os dentes amarelados pelo cigarro.

Escutei aquela tosse de um senhor

enrolado em cobertores que recordo da infância.

 

É como se os três estivessem ali me acompanhando…

Próximos, reconfortando minha despedida…

Me empurrando para um “viva”.

 

Eu visitei meus pais

Estive em Patrocínio.

Era dia de Finados

Eu não contive as lágrimas frente aquela lápide marrom e fria.

Recém construída.

Passei uma semana em casa… família… pai, mãe e ponto.

Se passaram 4 meses

E pareceu ontem.

A perda é algo que não passa

as lembranças são algo que sempre estarão ali.

 

Na rodoviária, aguardando um ônibus que sempre atrasa

Indo pra casa, não, saindo de minha casa…

Eu tive um momento nostálgico

Numa cópia da Certidão de Óbito do Sr. Honorico Corrêa de Melo

descrevi minha saudade

Transcrevo o que redigi no verso:

 

Da arte de esquecer da saudade

Minha presença foi repentina

Relampejo

Ausência

Mais uma vez: ausência

É um medo estranho

Quanto medo eu tenho destes vínculos quebrados

Boletos para os quais não encontro o dinheiro que pague

É uma holerite de vida desbotada

É um espaço de cheque assinado que não preencho

É uma tristeza de graça

É um desfazer fácil de sorriso

Sobre a lápide, fotos de sorrisos raros

existência humilde, luxúria,

avareza, amor

pecados

virtudes

passou

A proximidade da Honorana me deixa pálido, esquálido,  fraco

escuto o barulho do vento

me transporto para a porteira do curral

o gado e o estrume

a calça com o tecido puído

a memória da agulha fazendo remendos

sinto o cheiro do silo

subir o barranco e alcançar a jabuticabeira

eu consigo me lembrar dos três degraus

marcados na terra do silo abandonado

o cheiro de mexerica

a grande amoreira

o pé de manga, garagem do trator

é como se ainda pudesse ler cada paragrafo

de cada livro que li ali

E por ironia

me recordo exatamente de: “Sozinha no mundo – Marcos Rey”

naquele fundo da casa velha

depósito de defensivo de gado

o rego seco

a peneira, os lambaris

a represa

a passagem do gado sobre o córrego

a pastagem seca

a pastagem verde

e eu escuto aqui sentado na rodoviária o barulho do vento

como eu gostava de sentado naquela porteira

olhar a infinidade da pastagem

em direção ao “corguim”

e escutar o barulho do vento

barulho de vento

Era desejo de minha avó

que minha mãe ficasse com a sede da Honorana

mais que nunca

Eu quero a sede da Honorana.

Como as notícias presentes me tornam triste.

Eu amei muito minha tia.

Era alguém por quem tinha verdadeiro fascínio.

Penso se não era inocência infantil

Mas era o “melhor arroz do mundo”

Pior que antes de ódio

é tristeza

decepção

muita tristeza.

Tenho ímpetos de cólera

De apagar razão

soltar impropérios

mas só identifico meus soluços.

É Patrocínio.

Minha presença

um vazio indescritível que encontro aqui.

Eu me senti de uma forma “feliz-mal”

em uma espera de preenchimento

que nunca finda

Não há o que preencha

Há o que disfarce

Mas não tem fim

Talvez seja bem isso que denominamos

LUTO

O pior luto, é aquele por quem está vivo.

Rodoviária de Patrocínio, 14:18, 4 de novembro de 2011

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